O que é articulação em saxofone?
Um português bem articulado é um português com as consoantes muito explícitas e claras, no momento em que falamos, não escondemos os sons, e permitimos assim, ao ouvinte, a percepção imediata e inequívoca do que falamos. Utilizando-se para tanto da língua com convicção do que se fala.
Quando comecei a gravar vídeos para o YouTube, percebi que a câmera sugava um pouco de minha dicção, e se eu falava com oitenta por cento de compreensibilidade, as pessoas acabavam por absorver apenas sessenta por cento. Por isso tive, na marra, de aprender a articular as palavras. Falar de forma clara e inequívoca.
Se falássemos sem articulações acabaríamos por pronunciar apenas vogais, o que tornaria nossa fala quase que num grunhido incompreensível, de forma que precisamos articular para sermos compreendidos, sem articulação, simplesmente não há meios de se expressar.
O saxofone também é assim, não podemos tocar saxofone apenas ligando as notas com um sopro só sem separá-las em nenhuma medida, isso faria com que o saxofone assumisse uma característica de violino tocado com arco, tudo ligado, tudo sem clareza, tudo cansativo e pouco explícito. Não podemos tocar assim, não que o violino seja cansativo, mas definitivamente o sax não pode ser tocado assim.
Se alguém um dia exclamou a respeito de um instrumento que fala, esse instrumento é o saxofone. Há palavras no saxofone, há sílabas, vogais e consoantes, há articulação nesse instrumento, e precisamos aprender a fazê-la para poder progredir e nos expressar corretamente.
A articulação vem, em primeira instância para separar uma nota da outra. Lembre-se que, num primeiro instante, compreendemos essa separação, não como uma separação aérea, e nem bocal, nem da garganta, mas como uma separação feita exclusivamente pela língua.
O que quero dizer com isso? Que não produzimos vários sopros seguidos para separar as notas, não estamos fazendo e refazendo o sopro para terminar e começar outra nota, mas pelo contrário estamos com um sopro só, uma coluna de ar só, ininterrupta que permanece em meio à articulação.
Da mesma maneira, não estamos, a princípio, separando as notas por meio do desfazer e refazer da embocadura, pelo contrário, a embocadura, na articulação correta, permanece imóvel, o que faz com que o som não se interrompa, embora as notas estejam separadas.
Mais importante do que isso ainda, é o fato de que não usamos a garganta para fazer as articulações das notas, pelo contrário, a garganta tem de ser evitada nesse tipo de recurso do saxofone, pois usar a garganta pode viciar o músico nessa prática.
Percebi que muitos iniciantes possuem dificuldades extremas de compreender o conceito da articulação, e aqui vai um artigo detalhado sobre o assunto para responder a essa ansiedade que ronda muitos de meus alunos.
Mas se não é o ar, e nem a embocadura, e nem a garganta, o que pode ser responsável pela articulação das notas no saxofone? Se eu não interrompo o ar, e nem refaço a embocadura, e muito menos tampo a garganta (por exemplo, com sílabas como “ga” ou “ka”) o que me resta para conseguir produzir a articulação no saxofone?
O importante de se saber nesse assunto é o trabalho imperceptível da língua na articulação, é ela que é, isoladamente, responsável por toda a articulação tradicional do saxofone. As demais coisas devem permanecer sem alteração, e a língua deve sim trabalhar.
Mas como a língua trabalha nesse recurso da articulação no saxofone? Vejam bem, quando falamos a sílaba “tu” nossa língua encosta no dente superior, é uma sílaba que vem debaixo para cima, e ao encostar no dente superior, essa a língua rapidamente se retrai. Não podemos, ao utilizar a língua para produzir a articulação mantê-la próxima à palheta, ela deve se projetar, e imediatamente se retrair. Caso contrário, ela impediria o som.
A língua deve encostar, não na ponta da palheta, mas embaixo dessa mesma ponta, no sentido de interromper a vibração, para por meio disso separar as notas, quando falamos “tu”, estamos simultaneamente encostando a língua e soltando o ar e, numa fração imperceptível de tempo, permitindo, com a retração da língua que a palheta vibre plenamente.
Há uma articulação mais leve, do que o “tu”, e ela vem principalmente porque a tendência dos iniciantes quando começam no saxofone, de uma forma geral, é a de impôr muito a presença da língua na palheta para poder assim, produzir o som, o que ocasiona quase que um acento violento na pronúncia da nota.
Para conseguir amenizar esse efeito, devemos aprender a utilizar a articulação do “du”, com a consoante “d”, o que tornará a participação da língua menor, mais delicada, e mais suave. Há sim articulações mais pesadas, porém, devemos saber fazer ambas, e não estar viciados numa só delas.
Basicamente articular serve para iniciar o som da nota, e separar uma nota da outra, para tornar com isso, mais clara a intenção do saxofonista ao tocar uma melodia. A articulação do “tu” e do “du” são as mais tradicionais e mais utilizadas, se não sabemos dominar essas articulações não saberemos utilizar os outros recursos para produzir efeitos semelhantes.
Para momentos em que a articulação é muito rápida, aconselho que nem se retire a ponta da língua do espaço atrás do dente debaixo, ou seja, produza-se a articulação com o toque ainda um pouco à frente da metade da língua, para facilitar a agilidade. São macetes que a gente aprende com o tempo.
Como treinar a articulação? Com escalas, harpejos, músicas, produzir misturas de articulações com a ligadura em diferentes combinações, por exemplo, duas notas ligadas, e duas articuladas sucessivamente numa escala, entre inúmeras outras formas de se misturar e agregar articulação e ligadura etc.
Fazendo assim teremos um som limpo, claro, de grande penetração e riqueza, onde as palavras do saxofone tocarão nos ouvintes e produzirão seus efeitos plenos, e assim conseguiremos sem dúvida alguma produzir a magia do sax.
Daniel Vissotto