Primeiro de tudo o que é o perfeito? Seria aquilo que obedece todas as regras?
Antes de mais nada compreendamos que as regras musicais são convenções, construções humanas a partir de concepções muitas vezes arbitrárias, que não refletem a natureza, o âmago, o todo do sentimento.
Conheço gravações de grandes saxofonistas que contêm erros, e isso nunca me perturbou a ponto de eu não conseguir ouvi-las. Ainda que com uma tendência ao perfeccionismo, sempre me alegrei de saber que o mundo é um mundo de acidentes, e por isso mesmo ele é perfeito, por conta dos mesmos.
Saber se controlar musicalmente para cumprir as regras é bom, porém, controlar-se musicalmente apenas para cumprir regras, é algo limitado demais. Ninguém deveria tomar isso como finalidade.
Não conseguiríamos galgar novos estágios musicais se exigíssemos 100% do tempo o perfeccionismo de nós mesmos, seria um ato de selvageria conosco, no sentido de exigir do humano o que não lhe é próprio.
O ser humano erra, é próprio dele errar, e o erro na verdade não é um erro, é uma expressão do ser, como diria Miles Davis: “não se preocupem com os erros, eles não existem.”
Sim, é importante fazer bem feito, se possível perfeito, como se requer de alguém que está disposto a acertar, porém, quando isso não acontece, não há motivo para autoflagelação.
Todos um dia erraram, todos erram, a natureza erra, Aristóteles chamava isso de acidente, um fator que seria próprio e não estranho ao natural, porque uma folha de uma árvore é diferente das demais? Por acidente.
É importante ser perfeccionista, porém, a maior qualidade do perfeccionista coincide com o seu pior defeito, a saber, o próprio perfeccionismo, que, quando em demasiado, de nada contribui senão para a paralisia.
Se todos exigíssemos de nós mesmos a perfeição em todo o tempo, ninguém chegaria a lugar nenhum em nenhum momento. É necessário caminhar.
É importante dar valor à perfeição, mas é mais importante compreender que o humano erra, e que, sem a tolerância de si mesmo para consigo mesmo desse acidente humano, jamais chegaríamos a lugar nenhum.
Um passo ensina outro passo, muitas vezes o que não foi perfeito hoje, será perfeito amanhã em outra situação, estamos em constante aprendizado, ninguém nasceu pronto.
Daniel Vissotto