Em quase todos os vídeos que posto na internet me vem a pergunta a respeito de qual é o meu setup. Pois bem, diante dessa necessidade, venho neste texto falar do meu setup, e como desenvolvi essa opção para mim, o que não quer dizer que seja a opção para você, porém, fica como uma possibilidade.
Falemos de meu próprio setup, todos sabem que evito falar de marcas específicas, e evito até mesmo indicar esta ou aquela marca para os saxofonistas iniciantes que querem começar a tocar. Faço isso com frequência, embora muitos insistam ainda assim em me perguntar coisas nesse sentido.
Há um grau muito grande de responsabilidade nisso, pois é o dinheiro das pessoas que está em jogo, a minha preocupação com isso se dá pelo fato de que não quero ser responsável pelo investimento de cada um, de forma que geralmente dou apenas diretrizes gerais a respeito do assunto.
Entretanto, neste texto falarei de algumas marcas, é importante que se saiba que não estou ganhando um centavo sequer por mencionar tais marcas, ou fazer elogios ou críticas, de forma que tudo aqui é desinteressado, e visa unicamente ajudar, sendo no fundo, no fundo, uma questão de pura opinião.
Comecei a tocar saxofone numa igreja, e quando comecei, eu utilizava um saxofone emprestado, esta é uma solução muito boa para quem está começando, pois evita que se gaste dinheiro à toa, enquanto não se sabe se a paixão pelo saxofone é algo sério ou não em nossas vidas. Logo decidi comprar o meu próprio saxofone, questão de meses.
O saxofone que comprei era um Weril Master, o mais sofisticado saxofone de fabricação brasileira, utilizei esse saxofone por muitos e muitos anos, até um dia em que meu professor do conservatório de Tatuí me pediu, encarecidamente, olhando profundamente nos meus olhos que eu comprasse algo melhor, pois já tinha nível para tanto.
Percebi que era hora de mudar, eu era novo ainda, e meu pai me comprou diretamente, de cara, um sax 62 Yamana. Eu fui um privilegiado em meio à muitos que lidaram com esse problema no meu país, pois meus saxofones sempre foram bons demais para o meu nível, embora eu tenha sofrido um pouco com o Weril durante os seus tempos finais.
Nesse meio tempo eu conheci no conservatório um saxofone lendário, o famoso Mark VI da Selmer, no qual eu estudava sempre que ia ao conservatório, toquei muito nesse saxofone, embora poucas pessoas saibam disso, Jacaré, o meu professor na época, me permitiu tocar pois via em mim alguém muito interessado em aprender, e isso evitava que eu ficasse levando o meu sax todos os dias para o conservatório.
Conheci o Selmer Mark VI, e o Yamaha 62, dois grandes saxofones, porém, confesso que desde essa época, eu me apaixonei pelo som dos Yamaha. Gostava do Selmer, mas via no Yamaha algo mais próximo do que eu precisava em termos de facilidade de som, projeção, afinação, mecânica, e também timbre, o que pode parecer uma aberração para muitos.
A meu ver o sax Yamaha tem maior projeção de som, possui uma mecânica mais moderna e confortável, é um instrumento de grande facilidade de afinação, possui um acabamento mais bonito, e em termos de timbre possui mais brilho, e como sempre gostei do timbre dos Yamaha, embora muitos tenham tentado me dissuadir, achei que este era o meu caminho. Além de ser um instrumento extremamente estável, no sentido de não precisar de muitas regulagens por longo período de uso.
Fui fazendo um pequeno investimento todos os meses, juntando dinheiro aos poucos, pois queria muito comprar saxofones mais definitivos para mim, e visava conhecer o saxofone mais sofisticado da Yamaha, que até hoje é o Custom 875EX. Lançado pela Yamaha tardiamente, o Custom visa incrementar ainda mais a lata do 62 obtendo um timbre ainda mais trabalhado.
Confesso que quando adquiri o meu Custom Yamaha me decepcionei um pouco com sua mecânica, a ergonomia do 62 sempre me agradou mais, porém, o que os japoneses prometeram em termos de timbre não foi decepcionante, depois de fazer inúmeras gravações cheguei à conclusão de que o timbre do Yamaha Custom 875EX realmente era mais próximo do que eu buscava, de forma que acabei optando por ele.
Bem brevemente, com o investimento de longos anos de planejamento, sacrifício e economia, eu comprei outros dois saxofones, o alto, e o tenor da mesma linha, o Custom Yamaha 875 EX. Sim, eu era tenorista até então, tocava sax tenor. Foi quando escolhi a boquilha Dukoff como padrão para minha sonoridade.
Muitos têm na boquilha Dukoff uma boquilha extremamente estridente, e difícil de manejar, porém, eu decidi ficar com ela, por gostar de suas frequências mais agudas, isso no tenor e no alto, acreditei que dominando o som com essa boquilha, eu obteria algo muito próximo do que eu desejava em termos de saxofone. Um som aberto, porém, podendo ser aplicado ao Jazz e ao Pop.
Quando escolhi o Custom Yamaha, tinha a opção do Custom 82Z, voltado exclusivamente para o Jazz, e também do 875EX, que possui a vantagem de fazer um crossover pelo Jazz e pelo erudito, porém, ao tocar com o 875EX tenor eu percebi que ele tinha um timbre mais encorpado, sua lata é mais densa, ele é mais pesado, suas frequências são mais graves, e achei que isso compensaria as frequências agudas da boquilha Dukoff.
Dessa maneira, acreditei que dessa forma e com essa combinação encontrei, para mim, uma ótima combinação, decidi optar por ter todos os saxofones (tenor, alto e soprano) da linha Custom EX e também com boquilhas Dukoff (Super Power Chamber D7 para o alto e o tenor, e D8 para o soprano, pois via nisso um meio de ter maior projeção).
O fato é que a combinação de um sax Yamaha de som mais escuro, com uma boquilha rica em frequências agudas, foi compensatória pra mim, e eu senti nisso uma combinação ideal. Se eu tivesse escolhido o Custom 82Z provavelmente estaria insatisfeito com meu som, a novidade do Custom 875EX no mercado foi maravilhosa pra mim em termos de timbre.
Várias são as vantagens de se tocar em três saxofones do mesmo modelo, marca e linha. Como por exemplo, a vantagem de se fazer praticamente as mesmas posições dos superagudos nos três e obter resultados semelhantes, bem como a vantagem de ter a mesma mecânica atuando nos três sax, o que faz com que sintamos menos impacto da passagem de um para o outro.
Infelizmente a abraçadeira que vem na boquilha Dukoff parece mais uma piada, pois destrói a boquilha quando sequer fixa a palheta direito na mesma, por isso comprei uma abraçadeira BG desenvolvida propriamente para a Dukoff, o que foi um achado, pois na época foi muito difícil encontrar algo satisfatório para essa boquilha nesse sentido, uso essa abraçadeira até os dias de hoje.
Depois que tive o privilégio de comprar um saxofone desse nível, estabilizei meu setup, parei de investir dinheiro nisso, isso foi muito produtivo pra mim, pois subitamente passei a me preocupar unicamente em me desenvolver musicalmente, não tendo maiores preocupações com setup em nenhum sentido, e isso é bem uma verdade, por incrível que se pareça.
O microfone que uso para gravar é o HB Shure Beta 98H. É um microfone sem fio, que costumo usar nas minhas gravações e também em apresentações ao vivo, depois que descobri esse microfone decidi permanecer com ele para pegar um padrão de gravações e apresentações, e também pela praticidade do mesmo, pois costumo me movimentar muito e um microfone sem fio me facilita a vida nesse sentido.
Depois que estabilizei o meu setup com o Yamaha Custom 875EX no tenor, alto e soprano, com a boquilha dukoff, a abraçadeira BG, eu passei a usar também a palheta Vandoren ZZ, num primeiro instante na tentativa de quebrar um pouco o brilho do som no meu sax, porém, com o passar do tempo comecei a gostar mais e mais dessa característica, e transmigrei para a palheta de cana Vandoren Java Verde 2,5.
Nunca senti necessidade de uma palheta mais pesada, até mesmo porque as minhas boquilhas possuem uma abertura considerável e minha capacidade pulmonar se adapta perfeitamente a elas. Há saxofonistas que têm fissura por palhetas muito pesadas, eu não sou desses, procuro facilidade, afinação e timbre, é o que encontrei na Vandoren Java Verde 2,5.
O setup é como uma receita de culinária, quando se encontra um gosto muito forte em um sentido é preciso compensar em outro. Não há o melhor setup, há o gosto pessoal de cada um, há sim melhores marcas, que trazem maior conforto para o músico, embora não façam total diferença para o leigo que está ouvindo.
Além disso, o setup não é sinônimo de proficiência do músico, eu por exemplo sou a prova viva disso, sempre achei-me indigno do setup que possuí, pois sempre possuí saxofones muito avançados para o meu nível musical. Porém, não posso negar que isso foi uma coisa que me facilitou muito o aprendizado e os resultados que encontrei na música como um todo.
Para que você possa escolher o seu setup você deve em primeiro plano timbrar o saxofone, encontrar um som belo e envolvente de sax, depois disso, deve escutar muito os grandes saxofonistas e ter grande conhecimento das diferentes nuanças de som que estão disponíveis na linguagem do saxofone, só assim terá condições de saber para onde quer ir em termos de som, e assim saberá qual setup escolher.
O setup não é garantia de conseguir o mesmo som de determinado instrumentista de determinada época, muito pelo contrário, há inúmeros outros fatores que influenciam o som, ele facilita determinados timbres, é um facilitador, mas quem produz esse timbre é você, de forma que não podemos pensar que apenas pela compra de um saxofone, ou de uma boquilha conseguiremos determinado timbre ou coisa parecida.
Creio que a minha trajetória de como escolhi e no que me baseei para escolher o meu setup possa ajudar a muitos nesse sentido, porém, não encontrem nessas palavras uma regra, pelo contrário, o setup é uma questão de gosto pessoal, difere para cada um, e quem vai resolver esse problema para você sempre terá de ser você mesmo.
Daniel Vissotto