A criança aprende fácil, a criança aprende rápido, o velho é travado, o velho é lento. Isso seria mito ou verdade?
Não sou neurocientista, não teria base neurológica ou científica para afirmar nada aqui. Parto do princípio de que todos somos capazes de aprender algo, desde que compreendamos a importância disso, e desde que nos dediquemos de fato ao processo de aprendizado, e à adaptação que ele exige, confiando nele como tem de ser, parto da minha própria experiência como músico que sou, e que estou em constante aprendizado.
A criança tem a facilidade de ter uma vida despreocupada, uma vida mais simples, na qual ela tem de obedecer ordens, e muitas das vezes uma dessas ordens são: estude música. Tenho a certeza de que se voltasse no tempo, na época e que eu fosse criança, teria procurado entender essas ordens, pois muitas delas eu não compreendi como criança, o que me fez, com gosto, desobedecer à maioria delas. Eu não tinha consciência do que era importante e do porquê disso. Mas o fiz com alegria, e por isso valeu a pena.
Uma pessoa adulta já tem consciência do que são necessidades, uma pessoa adulta não se dá bem com ordens, pois procura entender as coisas, e uma simples ordem não lhe é suficiente para seguir em frente. De forma que o grau de consciência de um adulto é muitíssimo maior do que uma criança, porém, um adulto tem preocupações que uma criança não tem, contas a pagar, relacionamentos, emprego e outras questões. Isso faz com que, muitas vezes não se dedique à música como deveria.
De forma que, por esse lado há uma desvantagem e uma vantagem em ser criança e em ser adulto, dependendo do ponto de vista. O adulto tem maior consciência do que deve e do que não deve ser feito, porém, tem menos possibilidade de concentração naquilo que pode fazer, pois sua mente está ocupada com diversas atividades que lhe são custosas. A criança não tem muitas atividades com que se preocupar, porém, não tem consciência do que é de fato importante na vida, não compreende a grandeza do ensino, e o poder transformador do mesmo, por isso mesmo acaba se perdendo muitas vezes em suas próprias fantasias.
A vantagem de uma criança em relação ao adulto é o tempo que ela possui pela frente, ela tem tempo para errar, e também o tempo imediato que possui. Por não ter ocupações diferentes, ela tem muito tempo para estudar, por ser nova ela tem muitos anos de vida pela frente, ela terá várias chances pela frente. Porém, um adulto que estude bastante, também tem plenas condições de conseguir atingir um nível considerável na música, basta que se dedique e utilize toda essa experiência de vida para se conscientizar daquilo que realmente vale diante de si, um adulto deve aproveitar suas chances, independente de tudo.
O ideal é que não utilizemos de comparações, cada um tem o seu tempo, o seu devido florescer. Muitos florescem com tenra idade, outros mais maduros, porém, todos os que se dedicam, vêm a florescer. Se estivéssemos falando de uma atividade física que exige do corpo humano em plena juventude (como um jogador de futebol, por exemplo) aí teríamos de fato um fator limitante, mas a música não pertence a essa categoria, a música é, antes de mais nada, uma atividade intelectiva, que exige do físico em termos, apenas naquilo que lhe pede para poder reproduzi-la.
Aprender música não deveria ser uma atividade que nos exige resultados imediatos, não deveríamos nos prender a resultados, não é por causa deles que aprendemos. Mas pelo prazer de aprender, pelo prazer de fazer parte do processo, fazer parte da chamada brincadeira maravilhosa que é aprender um instrumento musical, ter a certeza de que estamos fazendo algo produtivo, algo real. Os resultados vêm, a seu tempo, para cada um de uma forma, em uma época da vida, basta que nos dediquemos, basta que nos entreguemos ao processo e não à cobrança de resultados, que eles vêm ao certo.
Antes de mais nada, chego à conclusão de que ninguém é velho ou criança para a música, de que devemos todos sim sempre olhar para a frente, até o último minuto, e se possível nos lançar adiante depois disso. A vida é muito curta para que nos preocupemos com “tempo ideal”, o tempo filosoficamente não passa de uma ilusão, muitas são as teorias do tempo, nenhuma delas me convence de que ele verdadeiramente existe e está por aí a ser visto, por isso, vamos todos estudar.
Daniel Vissotto