O sistema modal, tonal e atonal, um pouco sobre História e Filosofia para que você possa enriquecer a música.
Neste artigo falo do conhecimento que tenho a respeito de música, não intento aprofundar-me de forma a não estendê-lo demais em tamanho, será uma leve pincelada sobre os conceitos de música modal, tonal e atonal visando sempre o enriquecimento do conhecimento e da expressão musical.
Como Tudo Começa
Na história da humanidade, supõe-se que o homem começa fazendo sons, depois disso imita os sons da natureza, isso vai passando por sistematizações cada vez mais aguçadas, até que surge o ritmo, depois a melodia, e por último a harmonia.
A música modal, da maneira como a conhecemos no ocidente, surge na Grécia antiga, povos de cidades estado específicas tinham suas sonoridades específicas, os dóricos utilizavam a música baseada no segundo grau do que conhecemos hoje por escala maior.
Assim como os dóricos haviam os jônicos, os lídios (que por sinal não são gregos, para ser mais preciso), e outros povos, como os frígios, cada um com sua sonoridade própria dando origem às escalas dos modos gregos.
As escalas dos modos gregos são: jônico, dórico, frígio, lídio, mixolídio, eólio e lócrio. Todos esses nomes vêm de povos que cultivavam tradicionalmente essas sonoridades, de modo a trazer à luz uma música própria.
A Música Modal por Excelência
A música modal, como ela inicia, traz a idéia de que há um centro gravitacional muito bem definido, geralmente uma nota grave, em torno da qual gira uma ou mais melodias em contraponto.
Na escala C jônico, o centro gravitacional era o C. Na escala dórico, o centro gravitacional seria o D, na escala frígio o centro gravitacional já passaria a ser a nota E e assim por diante.
Não de maneira incomum alguns instrumentos dessa época eram dotados de 7 notas apenas, pois tudo fluía em torno das sonoridades ligadas aos modos do que chamamos hoje de escala maior.
Você pode estar se perguntando? O que seria um modo? O modo é a própria escala em questão com um novo centro, não mais a nota C, mas por exemplo o D (dórico) ou ainda, o A (eólio) e assim por diante.
A música modal grega foi encampada pela igreja, e a característica mais marcante dessa música é preocupação inequívoca de evitar a tensão do que chamamos de trítono (o intervalo de três tons), pois ele era considerado um acorde sensual e negativo para a influência do ser humano.
O Canto Gregoriano
Surge assim a música eclesiástica, por excelência o Canto Gregoriano, codificado pelo Papa e Doutor da Igreja São Gregório Magno (540 – 604). Uma música quase hipnótica e profunda, ritual, na qual o ser humano é levado imediatamente à meditação.
A música modal também é praticada, de forma característica, por povos do extremo oriente, índia, e também povos indígenas das Américas, geralmente, esses povos utilizam escalas diferentes, como por exemplo instrumentos que possuem apenas a pentatônica.
Sua característica principal é a de trazer uma nota (que chamaríamos de forma imprecisa) pedal grave, em torno da qual giram melodias e contrapontos.
Não há o conceito de harmonia nessa música, o que temos de fato, é a idéia de melodias que se entrelaçam criando uma sensação musical interessante, e também ritualística.
A questão é que a música modal por excelência começa a se esgotar em suas possibilidades, surge assim a necessidade de expandi-la, quebrar, pelo menos em parte com o centro gravitacional.
O Papel da Filosofia no Enriquecimento Musical
Isso tudo tem a ver com a história da Filosofia, embora esse não seja nosso assunto, conforme o homem vai mudando sua maneira de ver o mundo (primeiro um mundo geocêntrico, depois um mundo heliocêntrico, um mundo sem centro, um conhecimento sem sujeito etc.).
Entenda-se que a humanidade, no fim da influência do mundo geocêntrico de Aristóteles, entra em grande pânico e depressão, pois o homem deixa de habitar o centro de todas as coisas e passa a ser identificado como algo periférico.
É interessante de se notar que o sujeito do conhecimento (aquele via qual se estabelece a verdade científica, conforme concepção aristotélica, muda e no século vinte, bem como no século vinte e um é questionado de forma bombástica.
Entendia-se o sujeito como identificado com o tom musical, é determinante a influência da Filosofia na música erudita, principalmente, mas também na música popular.
O Sistema Tonal da Música
Voltando ao nosso assunto, a música, surge então a concepção de sistema tonal de música, ou seja, de melodia acompanhada, ou seja, o verticalismo musical, que nada mais é do que o acorde, ou ainda, tocar notas encadeadas em bloco, pensar a música dessa forma.
Surgem as funções harmônicas que podem ser resumidas em subdominante (transição), dominante (tensão) e tônica (resolução). Essas funções passam a ser sistematizadas na harmonia funcional.
A música não mais tinha um único centro, ousadamente ela abandonava esse centro para gravitacionar em torno de outras raízes, as funções. Há ainda um centro a ser obedecido, porém, a música abandona esse centro, criando sensações de tensão e relaxamento, de desejo de resolução.
Surge o arquétipo musical da jornada do herói, o sentimento de calmaria, tensão, um clímax de tensão, resolução, não necessariamente nessa ordem, a música é concebida como história, e não como algo estacionário.
A música tonal por excelência estabelece a volta ao tom, porém, não sem antes criar uma aventura de sensações que nos surpreendem a todo momento como numa história a ser acompanhada e sentida.
Como exemplo máximo de obra tonal temos O Cravo Bem Temperado de J. S. Bach, que é entendida como o exemplo máximo da música tonal.
Esta concepção musical tonal foi sendo desenvolvida aos poucos, surgem no Jazz e também na música brasileira, como por exemplo a bossa nova, acordes de empréstimo modal, acordes de função substituta etc. Enriquecendo assim o campo harmônico da escala maior e da escala menor.
É interessante de se notar que dantes, na música modal haviam os modos e eles viviam isolados em si mesmos. Nesse momento, o da música tonal, temos a definição dos modos maior e menor, como referência para tudo o que acontece.
Porém, esse modos possuem funções, e podem ser modulados para outros tons, o campo harmônico será explorado ao máximo de forma a criar inúmeras sensações surpreendentes no homem, não sem uma sistematização rígida e tonal.
É importante de se notar aqui que há várias escolas que explicam o assunto de forma diferente, porém, estou procurando transmitir a visão mais nítida do que seriam esses sistemas sem entrar em tantas polêmicas.
Enriquecendo a Música com Misturas
Surge as misturas, do modal com o tonal, uma música modal que possui acordes, e também até mesmo alguma progressão harmônica descendente da música tonal, porém, mais livre, sem ensejo às funções rígidas da harmonia funcional.
O cool Jazz de Miles Davis é uma espécie de harmonia modal, uma escala é definida como a base da improvisação e surgem acordes para que essa escala se expresse, sem recorrer às famosas funções.
Há também músicas que misturam as duas concepções na mesma progressão harmônica, trazendo trechos de harmonia modal e trechos de harmonia funcional. Tudo é possível na música, de forma que não há regras para a expressão humana nesse universo.
Com o advento do século XX a queda da concepção do sujeito na Filosofia surge a queda do conceito tonal, a música passa a ser atonal, não há mais funções a serem seguidas, desejos a serem criados, a nota seguinte sempre será surpreendente e imprevisível.
A Música Atonal
Como música atonal temos o exemplo do Free Jazz de Ornette Coleman, que traz uma grande desestruturação da música, no sentido de trazer sempre algo constante e de incômodo à luz, nada se pode prever nesse tipo de música.
A música atonal foi mais presente na música erudita do que na música popular, e se transformou aos poucos numa música, para muitos, descolada da libido humana.
É interessante de se notar que tudo é como numa evolução, são tendências que vão se estabelecendo aos poucos, em função do sentimento de cansaço, desejo, depressão, alegria etc. da humanidade.
A música sempre refletiu o pensamento humano, de sorte que a influência da Filosofia na música é determinante. Do sistema modal surge o tonal, e do tonal surge o atonal, e de todos eles surgem as combinações e misturas que enriquecem a música ocidental.
Surge também a música serialista, como por exemplo o dodecafonismo, música que preza pela não repetição de nenhuma nota antes da série de 12 sons, porém, isto seria tema para um novo artigo.
É preciso notar que, conhecendo o pensamento de cada sistema temos condições de trabalhar com nossa música, nossa harmonização, nossa interpretação e improvisação de maneira mais rica.
Fortalecer as Bases para Enriquecer a Música
É preciso crescer musicalmente. Apesar de ter a ressalva de que 90% por cento das músicas populares praticadas ainda hoje no ocidente descendem do sistema tonal. O sistema tonal é a expressão musical com a qual estamos acostumados.
O ouvido do homem comum no ocidente se habituou a ouvir músicas dessa maneira, músicas que possuem a rigorosidade das funções harmônicas (subdominante, dominante e tônica) estabelecidas.
É preciso saber que antes de entrar para o conhecimento de escalas exóticas, é preciso dominar as escalas básicas do sistema tonal, para podermos por meio disso falar a linguagem do homem comum.
Quem fala a linguagem do homem comum no ocidente agrada a todos, e é pensando nisso que produzi o e-book Escalas Maiores e Menores para Sax – A base para você soar bem.
Este e-book visa trazer as bases do sistema tonal ao músico de saxofone, tanto em termos de conhecimento, como em termos de fraseado, bem como todas as demais faculdades ligadas a esse conhecimento.
É preciso conhecer as escalas maiores e menores para poder se expressar no sistema tonal de música, aquele que fala a linguagem de mais ou menos 90% das músicas do ocidente.
Guarde um tempo para conhecer este e-book, e não se arrependerá.
Daniel Vissotto